sexta-feira, 29 de abril de 2011

Amor de bolso

Para Bauman






Você o guarda no bolso
da calça, entre as chaves,
as moedas e o papel amassado.
Carregando-o para cima e
para baixo. Sacudido na
beira do saco.
E se houver um rasgo?
Um buraco ocasionado
pelos seus flamejantes passos.
Um rombo nos panos
eternamente costurados.
E se ele cair estatelado
no asfalto?
- O que faço?
Te respondo:
- Procura rapidamente
um outro amado!

sábado, 23 de abril de 2011

Não há mais tempo para a invenção de amores. Envelheço. Vejo as rugas, as covas, os desgastes do meu coração. Quando leio um verso, sou incapaz de guardá-lo para outrém. Toda a poesia é para mim. Para a minha desolada solidão. Movimento egoísta. Estanco o-que-podia-vir-a-ser com poemas: meus, da Cecília, Hilda, Ana, Ilma, Gilka. Poesia feminina que me atinge nas partes mais baixas. Atingindo meus cabelos, seios, clitóris. Sou uma mulher (des)esperada. À espera da pessoa certa? Do romance perfeito? À espera de esperanças que insisto em manter vivas? Não mais. Nnguém à espera. Desesperançada, desmotivada, descompassada, des. O quê mesmo? D-E-S-E-Q-U-I-L-I-B-R-A-D-A! O prefixo a me provar que as coisas podem ter existido, mas agora elas morreram, não existem mais, des-existiram de mim. Desavisada, tentei me erguer nnos últimos meses, tentei ver o mar, escrever, cantarolar umas canções femininas: Vanessa, Tiê, Céu, Marisa, Janis, Norah, Ângela, Shakira. Todas essas mulheres nos meus ouvidos a me convencer a desacreditar no amor. Sofrimentos alheios tão meus. Desgovernada, descompassada, desarticulada me vejo des(conhecida) de mim. Sem saber ao certo o que isso significa. A repetir as mesmas palavras, resposta para todas as perguntas: - É o desamor!

terça-feira, 19 de abril de 2011

A eterna dor


Porque eu sinto doer sempre. Não uma, nem duas vezes, mas sempre. A cada badalo do relógio, a cada giro dos ponteiros, está lá doendo. Algo que eu não sei bem dizer o quê. Algo que não tem nome, cor, cheiro. Que acho ser você, mas não é. O que dói é bem maior que seu mundo colorido repleto de submundos inventados, amores gastos e umas doses de repetição alheia. O que dói em mim: dói. Não é uma coisa que se cura com birita. A vodka apenas ameniza, mas não passa. talvez a minha dor seja invisível e isso a torna ainda pior. Como se eu tentasse vencer algo que não vejo. Esmurrando o vento, chamando de inimigo meu maior amigo. É isso que não é capaz de compartilhar? a dor? de ser tão pequeno nesse mundo extravagante? Sim, é assim a dor. Uma constante comparação, capaz de tornar ínfima qualque metáfora pós-moderna. A dor está lá sempre como um bom monstro que aniquila, maltrata, gasta, te devora. A dor me dilacera. A dor: a ilusão de que há alguém que se habilita a também dor: a dor : a decepção daquele que a vende por não querer: a dor: sendo vendida porque nunca a sentiu deveras. Eu sinto a dor e isso não me torna superior. Ao contrário, me sinto fraco, inseguro, incapaz. A dor não permite que as ideias tomem corpo, que os planos ganhem traço. A dor apenas dói. A dor apenas sabe doer. Como agora, que está doendo doloridamente.

domingo, 10 de abril de 2011


Pensei em te ligar agora. Sobram créditos no aparelho celular e sinto frio. Na verdade, meu corpo quasenu nada sente, a não ser estafa sonolência tédio: sempre ele - o niilismo.

Pensei em te ligar. Talvez até disquei os números. "-Chamou?" Não ouvi. Há algum tempo já não nos ouvimos. Eu sempre monologozando a sua presença. Falando pelos cotovelos, joelhos, dobradiças. Você em silêncio, contemplando a linguagem. É nesses momentos que os versos-negros, as palavras-farpas te sobem ao crânio? Ou está como sempre excitado com o passado, a noite anterior, o velho-novo-revivido-amor?

Pensei em te ligar. Pensamento bumerangue, esse caminho infértil das palavras: a caneta incerta, o papel problema, as ideias vácuo. Tropeço, caio, espatifo na página em branco. Herói é o inseto!

Pensei em ligar. Para qualquer número, qualquer lugar. Ouvir uma voz nesse domingo. Ouvir qualquer coisa além das minhas censuras, meus piores devaneios. Um dia me busco dentro de mim. Sim, caí numa farsa de não ser-eu. E não me recupero.

Pensei ligar. Digito os mesmo números (seus) pela quarta quinta vez, não lembro. Somos dois ausentes. Cansados, inclusive, de intercambiar solidões. Bibelôs inconscientes dessas mocinhas. Somos os fétidos passageiros, os decadentes públicos. Os eternamente gozados (ou gozosos?). Sente esse peso nos fim das tripas? O nó de marinheiro na garganta? Tenho a impressão que só nós dois temos esse verme. Mas o mundo todo anda desnutrido, meu bem.

Pensei. Mas foi rápido. Um instante apenas. Sabia que não tinha papo. Não temos modos. Você não quer mais me escutar. Espero que continue nessa procura: a busca eterna. Porque, a conclusão ainda me desola. Soletro as letras, me despeço. "Como não estragar esse texto?" Me pergunto. Disco os números pela última vez, tu tu tu tu, não me atende