domingo, 25 de dezembro de 2011

Flor e abismo?



Eu trago comigo a doença. Adentro nos corredores, invado as recepções, e algo em mim incomoda. Eu sinto. Talvez o tumor esteja na minha alma, sambando em todas as vibrações, sendo o centro. Talvez a alma esteja mesmo apodrecendo. Algo em mim apodrece, te digo. Digo, disse que tenho medo da morte, mas vejo ela todos os dias rindo ao meu lado e me oferecendo aquele avental branco como as paredes dessa casa que me fazem chorar. Eu te disse. E você fez disso uma piada. "As pessoas não morrem quando querem morrer, querido!". Me disse. E aquele sorriso amarelo e os seus olhos gastos me deixaram repentinamente sem ar. Foi quando descobri que já estou morto, assim como o personagem do Caio. "flor e abismo"? Me pergunto, mas só vejo o abismo, o abismo: agulhas, seringas, soros, enfermeiras, vômitos! É você que vai trazer a flor? E quando? Cara, venha logo me salvar, traga nos bolsos um cigarro, pode ser fino, não ligo. Tomamos uma dose em qualquer lugar, mas vamos sentar no meio fio por quinze minutos e me deixa falar sem pausa. Me deixa dizer como é essa dor? Me deixa chorar e rir e lamentar e fingir que vou me recuperar no dia seguinte. Me deixa ao menos ter a ilusão que depois que você for embora eu vou poder descansar tranquilamente e não mais ligarei o computador, nem ouvirei Adele, nem lerei nada sobre as outras aventuras conjugais. E não serei feliz, mas finalmente calmo. Eu vou desligar as luzes, fechar a casa, colocar uma garrafa de vodka debaixo do braço e o livro do Caio debaixo do outro, vou pegar qualquer avenida e vou parar na porta da sua casa, vou bater e esperar que você me atenda e me oferça maracujás, faça um drink e me ponha no seu braço e me embale. Até que eu durma e esqueça que estou sufocando, sufocando.