domingo, 15 de abril de 2012



sempre uma dose a mais”




Eu sabia que deveria ter entornado o copo com o líquido azul na tua roupa. Foi o liquido, algo fluido como o sentimento que de repente se apossou de nós. Foi aquela mistura indecorosa de vodka, gelo, e pó azul que me tornou outro. O maldito líquido me fez agir daquela forma sôfrega, um tanto quanto prostituída. Se houvesse em ti derramado o conteúdo do copo não haveria aqui essas marcas que até hoje eu me pego contemplando. Se em ti o líquido azul houvesse derramado, talvez eu desejasse uma outra bebida e você, insensível, quereria uma outra roupa. Mas ao contrário, eu segurei firme o copo nas mãos, como quem prevê o desastre, como quem prefere sofrer a posteriori. Os meus dedos permaneceram firmes, embora meu corpo estivesse cambaleando, embora a minha consciência me avisasse da cilada que teus braços representavam, eu permaneci. Talvez eu culpe o líquido pela pressa com que as coisas aconteceram, com a facilidade com que me permiti. Talvez eu nunca mais repita a besteira de beber tanto líquido azul. Talvez nunca mais eu vá a um lugar feio e sujo e faça aquelas coisas. Que eu nunca mais invente promessas só minhas, que eu nunca mais espere. E que nunca mais eu pense em abandonar tudo, as pessoas, os projetos. Que nunca mais eu interprete educação com sentimento-surgindo. Porque diabo aquele líquido etimologicamente lascivo não me fez ver a verdade? Por que ele não me mostrou que era apenas prazer? Se tudo era líquido em quê quis eu me apoiar? Até hoje eu não entendo esse meu comportamento de criança que nunca leu o Zygmunt Bauman. Até hoje eu não entendo porque eu não consigo esquecer. É por isso que eu deveria ter entornado o líquido em você. É por isso que eu deveria ter entornado o líquido azul ao invés de beber