quinta-feira, 30 de setembro de 2010

O violoncelista


Ele enlaça o violoncelo

Como quem abarca uma mulher:

Dedilha os cabelos,

detém entre as pernas as ancas,

Fricciona as vértebras.

E em êxtase, lambe

com a ponta dos dedos o umbigo -

elo transcedental dela -

onde a boca dilata-se

em notas musicais.

domingo, 26 de setembro de 2010

Verdadeiramente

Eu te queria. Não sei se na minha cama, nua, com os cachos espalhados no meu travesseiro, com meu braço repousando sobre teus seios. Te queria verdadeiro, verdadeiramente. Com o desejo que me remete ao verbo querer. Com essa frase que insiste em não completar o pensamento, que insiste em não ordenar a desordem. Com muitos dois-pontos. Assim, com repetições, com vocabulário ínfimo, com tanto plágio: Te queria.
Absurdamente, entende? Com ânsia, com fome, com exacerbo. Te queria malucamente. Nos lugares mais estranhos: dentro do meu armário, dentro da minha mente, dentro de mim? Sei que queria com tanta força, com tanto egoísmo. Aos poucos, como uma droga que vai terminando, como o cigarro que vai queimando, te queria.
-Grito. -
Por mais tempo, com muito silêncio - coisa que me incomoda nos outros - Com essa dor que não me dói, mas me fascina. Te queria porque você me furta, me rouba, me cativa ainda? Sim é uma súplica!
Perto, frequentemente, em demasia. Deveras te queria mais próximo. Que me visitasse e me revisitasse. Que me tivesse pelo avesso: com meus medos, com minha parte mais suja, mais podre. Queria não apenas como uma bibliografia, não apenas como uma influência. Te queria na minha rotina, nesses teus trejeitos que me flagro repetindo. Com essa ausência, com essa falta que nunca se completa. Com esses textos que trocamos. Com esse texto que mesmo que chegue ao fim não é capaz de te dizer como te queria.
Te queria.
Simplesmente te queria.
Te queria (,) vê.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Nada poético IV

As coisas mais bonitas que tinha para te dar, ofereci numa mesa qualquer.:Vinhos, cigarros e a sua recorrente inconsciência que me permite ser sincero. A tua recorrente traição que me humilha e me rebaixa mais do que qualquer palavra, mais do que qualquer silênciio. O que quer? Que grite em letras garrafais? Que estampe em todos os jornais que é você que me deixa infeliz? Que é por te ter hipocritamente que sobrevivo? Que tua presença me faz perder a noção do bem e do mal e do absolutismo? - deve ser isso, então, o romantismo!
Porque então aqueles comentários torpes, a insistência, o prazer do meu sofrimento em meio a tanta torpeza, o debruçar-se sobre o infeliz. Qual a necessidade de me fazer espectador? Qual a necessidade de se fazer cobaia disso tudo. Sofro duplamente: por ti e por mim.
Te odeio unicamente: por não ter reservado à confissão o valor que lhe era devido. Por não ter respeitado, por não ter repartido, por tão poucas considerações (sempre acabamos desconsiderando o próximo, porque?)
O radicalismo me afeta e te queria longe, distante, porque capitulamente me respondde que não há ciúmes. És inerte, fraco para assumir que o problema existe. Menino demais para esperar a
ânsia passar. Recorre logo a outros braços, recorre logo a outras necessidades.
Afinal, como faço para que me largue? Para que não exista mais você entranhado em mim? Como faço pra que apenas eu me machuque?
-...
Não respondes. É apenas mistério e sofrimento

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Nada poético III

"Eu faço viagens movidas à ódio" Ana C.
Sede demais afoga. Sede demais sufoca. Eu repito para mim mesmo, resmungando, enquanto esmurro a porta. Repito para mim ou para ti? Não sei. Em alguns momentos fica tão díficil delimitar onde termino e onde começas.
Qual é o medo que te consome? Some: o meu: toda a existência sem você! Madrugadas solitárias, abandonos em eventos, a falta da minha na sua poesia. Silêncio, reticências, beijos bêbados, a não-partilha dos fatos.
Eu assumo toda a culpa sem estalos, nem alardes. Sou eu que estou destruindo o inexistente. Sou eu que reparto os detalhes, conto as gotas da sua paciência. Sou eu que pulso pulsilânime. E não tu. Eu a acusar, a apontar com o dedo em riste. Eu que não noto que todas as pessoas são feitas de outras pessoas e te quero apenas no meu território, no meu domínio. (Essa escrita sem poética - fria, crua, vai acabar me fodendo, eu sei). Eu, egoísta como sempre, impregando tudo com o meu pronome possessivo, que faço verbo - sempre no presente do indicativo.
E agora viajo -odiento - que sempre está aí, virtualmente se esquivando. E nessa viagem choro copiosamente, momentos eternos de solidão descompassada. Queria te jogar todas essas traições que invento na sua cara. Ter um dia apenas em que não sejas a vítima e eu o malfeitor. Fazemos um mal enorme um ao outro, percebes? Reconstruo a frase: Te faço um mal enorme, percebe?
Te mando embora e espero o contrário. E quando noto que não está mais, quase que não respiro... de ódio!

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

ao silêncio

Elas estão em silêncio. Não as ouço mais, elas não me ouvem. Quem de nós sumiu para o outro.?Será que a saudade ecoa na parede vizinha como cá na minha? Leio palavras antigas, homenagens longas. Acho que não sou mais aquele ser venerado em textos longos, em poemas rimados. Eles não me amam mais, contesto. Não sabem meu telefone, não lêem meus escritos, não discutem mais comigo. Vivem vidas das quais não me incluo. Conheceram novas pessoas - mais ou menos interessantes que eu - vão a lugares que não frequento, não cometem as mesmas loucuras que cometo. Eu desconheço suas ânsias, medos, projetos. Não os incluo nas minhas dores, não divido minhas doses, não os convido para cinemas, teatros, momentos de solidão. Estamos indiferentes. Aconteceram tantas coisas entre isso. E só o silêncio parece nos unir agora - coisas não ditas. Quando não há mais palavras, quando não há mais momentos para serem vividos, quando não há mais ideais e planos em comum, sobra apenas a hipocrisia de gostar, a consideração momentânea, a lembrança indigesta. (vou correr para a minha caixa de cartas e lê o passado como se fosse presente). Somos todos autores de tempos que já se foram. Eu queria ter um encontro com cada um desses autores como encontro O Caio, A Hilda, A Ana constantemente. Queria revisitá-los, lê-los, questioná-los. Queria que eles não fossem para mim significante puro, desejaria redescobrir o significado deles. Talvez um dia numa mesa com toalha branca, uma garrafa de vinho -ou fodka - separando nossos rostos. Talvez nesse dia, faríamos a digestão das lembranças, e gostaríamos verdadeiros e novamente um do outro.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Nada poético II


Somos dois. Cada um com seu espelho. Eu não me vejo no teu. Você se ver no meu? Sim, é um convite. Venha: demore bastante aqui defronte, percorra todas as letras, soletre as palvras, depois leia devagarzinho as frases - parágrafos - até sentir o texto completo. Agora me responda bruscamente: Se vÊ?- te pergunto isso enquanto te digo poéticamente "A palavra nos desnuda, fato!". Por que eu faço o mesmo processo com o teu espelho. Eu olho lentamente, tento me encontrar nas palvaras, unir as frases, desbravar o intertexto: - Onde estou? Onde estás? - me pergunto. Parece que brinco de Onde está a Dulce Veiga? - Brincamos?- . Ás vezes eu te acho distante, as vezes eu olhoolhoolho e acho que estou olhando o espelho errado. E cada vez que eu olho no seu espelho eu me sinto ainda menor, como se minha face se dissolvesse, como se meu rosto se dissipasse! E nessas horas eu sinto um medo tão triste, um medo recorrente de perder. Ou pior: viajo que isso é uma mentira que contei para mim. Que não há espelhos, que não "havemos". Termine: dê a última olhada e diga que sim, que se encontra no meu espelho. Uma mentira doce que seja. Sabe o que deliro às vezes que olhar teu espelho é perder-se e eu só te encontro quando te olhoolhoolhoolho no olho.

domingo, 5 de setembro de 2010

Nada poético!

Eu queria compartilhar com você uma porção de coisas: o medo, a vergonha, a fraqueza, essa ânsia. Queria que estivesse mais perto. Já sei que estamos distantes e agora a distância física -ao contrário do que imaginava - me dói tanto. E quando eu ouço as tuas ameaças vejo como é igual aos outros, vejo como estou repetindo as histórias, repetindo outros em você. Sei que sou o único culpado e ela já havia me dito que ficaria sozinho mais dia menos dia, não precisava repetir. Eu sei que você vai embora, eu já sinto - premonições que tenho sempre - que está indo. E vou te perdendo cada vez que abro a boca - sina minha. Fico pensando nas coisas que você nunca poderia me acusar e só me vem uma a cabeça: de não te amar com as entranhas. O resto eu sou mesmo, possesso demais, ciumento idem, vóluvel e dramático em excesso. Essa insegurança toda é a certeza de que não vai ser para sempre, que não vamos envelhecer juntos-sós. Eu fico pensando na minha culpa e não posso deixar de ironizar a tua perfeição. Estamos num estágio que nada mais se salva. "We're gonna be sinkin soon", já dizia a Norah Jones. E o que eu queria te falar seriamente é que não está sendo legal mesmo, que eu sofro muito com tudo e está na hora de dar um basta. Mas aí, 'masoquisticamente' eu sei que quando parar eu piro, ficarei muito pior. "Quando você sofre eu não passo bem". Assim como você eu tenho tanta coisa não dita. Assim como eu, você pode falar:
- Pega essas coisas não ditas e enfia no cú. Porque eu vou fazendo outras coisas com elas.